A RESPONSABILIDADE DA SOCIEDADE CIVIL NA PARTILHA DE INFORMAÇÃO SOBRE SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS


O Director Executivo da Omunga, João Malavindele abordou o tema sobre a “Responsabilidade da Sociedade Civil na partilha de Informação sobre Segurança Pública e Direitos Humanos”, na 1ª Conferência Nacional sobre Direitos Humanos e Segurança Pública, realizado em luanda, no dia 1 de Dezembro, pelo Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos em Parceria com o Comando Geral da Polícia Nacional.

Leia a apresentação na Íntegra:

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A RESPONSABILIDADE DA SOCIEDADE CIVIL NA PARTILHA DE INFORMAÇÃO SOBRE SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS.

 

Saudações a todos e a todas!

Quero agradecer em nome da minha organização pelo convite formulado, é um prazer enorme fazer parte desta augusta assembleia para podermos discutir os nossos problemas de forma livre e desapaixonada. Muito obrigado mais uma vez.

Conceito de direitos humanos e segurança pública

Direitos humanos: os direitos humanos baseiam-se na noção de respeito pela dignidade humana. São, portanto, direitos inalienáveis na medida em que ninguém pode ser deles privado.

  • O direito de não ser sujeito a quaisquer formas de violência por entidades públicas ou privadas;
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  • O direito de não ser torturado, nem tratado ou punido de maneira cruel, desumana ou degradante.
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  • Direito à vida VS Execuções Extrajudiciais
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“O Estado angolano respeita e protege a vida da pessoa humana, que é inviolável artigo 30º CRA”

O grande problema reside em como conciliar a necessidade de garantir a ordem e a segurança pública e o cumprimento e respeito dos direitos humanos, por exemplo:

O  Executivo angolano, adoptou de forma prudente e assertivamente, medidas de contingências com vista a suster a propagação da COVID-19. Inicialmente fechou as suas fronteiras através do decreto presidencial. Na sequência o Presidente da República depois de ouvir o Conselho da República e a Assembleia Nacional declarou o primeiro Estado de Emergência no dia 27 de Março. A partir daí muitas organizações da sociedade civil se organizaram e trabalharam na sensibilização dos cidadãos relativamente aos cuidados a ter para evitar a propagação do vírus. Neste quesito as organizações atenderam o pedido do Sr. Ministro do Interior. Assim sendo a palavra, “FICA EM CASA” foi uma das principais recomendações do Ministério da Saúde.

Infortunadamente, os  agentes da ordem e segurança pública fizeram o uso excessivo da força, em nome da ordem e da tranquilidade pública,  no intuito de fazer valer o cumprimento do decreto presidencial que impunha a limitação de direitos e garantias fundamentais.

É desta forma que muitos cidadãos foram detidos e levados ao Tribunal por não terem feito o uso da máscara na via pública.

A detenção do activista da OMUNGA, Livulo Prata,  é um exemplo paradigmático. O mesmo, encontrado na paragem a espera de táxi foi  interpelado por um agente da polícia, e em acto contínuo levado a esquadra mais próxima. Dois dias depois submetido à julgamento.

Neste período muitos cidadãos viram a sua liberdade cortada por causa de uma infracção administrativa.

Poderíamos aqui elencar várias situações do género que aconteceram e ainda continuam a acontecer no nosso país, por isso se torna justo e legítimo questionar o porquê destes excessos. Ou seja, os cidadãos questionam, o que tem levado os órgãos de segurança a não agirem em conformidade com a lei?

No nosso contexto actual estás duas dimensões, garantia de segurança e respeito pelos direitos humanos, parecem antagônicas, isto é, inconciliáveis.

Predomina entre nós uma certa cultura, confirmada por uma prática constante, segundo a qual, o respeito pelos direitos humanos é, de alguma forma, incompatível com a efectiva aplicação dos mecanismos operacionais que garantam a almejada “segurança pública”.

 Bom, os que assim pensam entendem que para capturar um delinquente, garantir a sua condenação ou baixar os índices de criminalidade é necessário ludibriar a lei, e consideram legítimo recorrer ao uso excessivo da força e à «medidas excepcionais» de combate ao crime, que incluem execuções a indivíduos confirmados ou suspeitos de serem delinquentes.

Relativamente ao uso da força existe uma diferença entre a polícia e os delinquentes. Os delinquentes actuam sem regras, os polícias devem fazê-lo observando as regras. Quando os polícias actuam a margem das regras, transformam-se em delinquentes, daí, a polícia confundir-se com um grupo de homens armados, que usa a sua autoridade para cometer crimes e violar os direitos humanos.

Isto constitui um perigo, se não mesmo um atentado para o Estado de direito democrático. Por exemplo, na fase da COVID-19, isto é, no período de 2020 à 2021, a OMUNGA e a AMNISTIA INTERNACIONAL denunciaram 7 casos de jovens que foram mortos por causa da actuação da polícia. Foram actos de negligência perpetrados pelos agentes que tiraram vidas de jovens e adolescentes.

Trazendo aqui outro facto que teve lugar em Luanda, no ano transato, “um efectivo da Polícia Nacional, foi acusado de matar dez detidos na esquadra 41ª do bairro Balumuka, município de Cacuaco, em Luanda, com um suposto Chá”.

As Nações Unidas definem execuções extrajudiciais como a privação da vida sem um procedimento judicial completo e com a participação, cumplicidade, tolerância, aquiescência do Governo ou seus agentes. Nesta noção inclui-se também a morte provocada por uma excessiva utilização da força pela polícia ou pelas forças de segurança.

OS COMPLEXOS SOBRE O DIREITO DE MANIFESTAÇÃO

Diz-se que o direito de manifestação é um direito complexo. É um direito complexo ou existirá entre nós um certo complexo no que toca ao seu integral e pleno cumprimento?

 Senão vejamos:

 A CRA, consagra no seu artigo 47º o direito de reunião e manifestação. O próprio preceito limita positivamente este direito. Ou seja, elas só serão admissíveis se forem pacíficas e realizadas sem armas.

É irrefutável que o exercício do direito de reunião e manifestação não carece de autorização para ser exercido, pese embora a constituição consagrar que a realização de reuniões e manifestações em lugares públicos (deve ser precedido de uma comunicação à autoridade competente (carecem de prévia comunicação a autoridade competente, nos termos e para os efeitos estabelecidos por lei). Neste caso trata-se da lei 16/91 de 11 de maio, lei sobre o direito de reunião e manifestações. É na questão da comunicação prévia onde reside um dos aspectos mais complexos da nossa actual realidade.

 

Ora, tratando-se de um direito fundamental, entende-se que o direito de reunião e de manifestação é, como os restantes desta categoria de direito, de aplicabilidade directa (nº-1, do artigo 28º da CRA) ou seja, é um direito que vincula a todas as entidades públicas e privadas de um dever geral de se abster em praticar actos que possam condicionar ou impossibilitar a sua realização, precisamente porque se considera que o seu exercício é de importância fundamental no Estado de direito e democrático.

Dito doutro modo, ninguém pede autorização para exercitar o direito à vida, ninguém pede autorização para exercitar o direito a integridade física.

Daí que seja normal as pessoas se perguntarem: se o direito de manifestação é um direito fundamental e, por conseguinte de aplicabilidade directa, qual é a necessidade de ter de se comunicar a autoridade o seu exercício?

Bom, do ponto de vista da ordem pública está aparente condicionante justifica-se apenas pela necessidade de salvaguardar direitos e interesses de outras pessoas. Nesta perspectiva, compreende-se por exemplo, que para assegurar a boa fluidez do tráfego e a circulação de pessoas numa cidade como Luanda, se justifique que seja feita uma comunicação prévia.

Uma outra situação que inviabiliza o exercício deste direito são as reuniões exigidas pelas forças da ordem, que as vezes servem mais para persuadir, até mesmo intimidar os manifestantes a exercerem os seus direitos constitucionalmente consagrados.

Em suma, a necessidade de se garantir a segurança pública não pode funcionar como pretexto para as recorrentes e flagrantes violações dos direitos humanos.

Por esta razão é que se assiste, cada vez mais, a uma degradação da imagem policial e por via disso, um certo distanciamento entre a polícia e os cidadãos.

É curioso neste aspecto o sentido e o alcance da mensagem que subliminarmente a população vem tentando passar. Eis os respectivos dizeres: “num caminho escuro de duas saídas em que numa esteja um policial e noutra um delinquente as pessoas escolhem a segunda saída porque preferem enfrentar o delinquente”.

Embora seja tão dramático os dizeres precedentes, a verdade é que a imagem projectada pela polícia nacional ao público, parece bem mais pior do que o conto ilustra.

Não reconhecer, da nossa parte, o esforço ingente que o executivo tem estado a empreender no sentido de dotar a nossa polícia com mais meios e homens, seria desonesto.

Da mesma forma é preciso assinalar um conjunto de políticas levadas a cabo pelo executivo, através do MJDH, como é o caso da Estratégia Nacional dos Direito Humanos que eleva a questão dos direitos humanos como uma preocupação de Estado.

No entanto, todos estes esforços e iniciativas serão frustradas caso permaneça uma atuação policial não garantística.[i]

Precisamos trabalhar todos no sentido de afastar de uma vez por todas este antagonismo entre direitos humanos e a segurança pública, é totalmente falso. É possível respeitar os direitos humanos, obstando dos abusos estatais de qualquer ordem, é fundamental. Segurança pública é uma responsabilidade colectiva.

Muito obrigado!

João Malavindele Manuel

Director Executivo da Associação Omunga

[i] i https://www.omunga.org/index.php/2022/03/31/agente-da-policia-nacional-acusado-de-matar-dezdetidos-com-cha/

https://guilhermedesouzanucci.jusbrasil.com.br/artigos/554147060/ha-confronto-entre-direitos-humanos-e-seguranca-publica

 Relatório Segurança Pública em Angola – Fundação Open Society

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