COMUNICADO Manifestação de 17 de Junho


Face ao número de ilegalidades – e crimes que chegaram a causar perdas humanas – cometidas em torno das manifestações que têm ocorrido, em várias partes do país, desde a subida dos preços da gasolina e em resposta à campanha de omissão e desinformação que tem sido feita, os organizadores de citada manifestação (associações e individualidades), vêm, colectivamente, recordar alguns princípios basilares de qualquer democracia e partilhar alguns factos:

  1. As manifestações são uma consequência do descontentamento da população, face à subida brusca do preço da gasolina (perto de 100%), a pressão sobre os vendedores informais e pequenos operadores económicos e as tentativas de limitar a autonomia das organizações da sociedade civil. São pois o resultado directo do que muitos cidadãos – no seu direito – consideram serem políticas com uma completa falta de sensibilidade para os impactos sociais, económicos e políticos sobre os mais pobres;
  2. Vários cidadãos envolveram-se na mobilização, preparação e nas próprias manifestações – direito que lhes é reconhecido por lei. Qualquer indivíduo ou partido político que se reveja nos lemas da manifestação, são livres para se associarem a elas e para as apoiar;
  3. É obrigação da Polícia Nacional proteger os manifestantes e identificar e agir contra quem cometa crimes. Saber distinguir quem se está a manifestar e quem está a cometer crimes é também sua função. Qualquer acção contra quem cometa ilegalidades tem de ser feita no quadro da lei. Identificar de que partido são os organizadores ou participantes não é, claramente, uma função da polícia, nem serve qualquer propósito de segurança pública ou defesa da ordem;
  4. É obrigação dos Órgãos de Comunicação Social, em especial dos públicos, darem aos manifestantes o espaço para que possam comunicar à opinião pública as suas razões e a sua versão dos factos relacionados com o decorrer das manifestações.

À luz destes factos e princípios, queremos realçar o seguinte:

  1. A repressão quase generalizada – excepção honrosa para as polícias da Huíla, Kwanza Norte, Kwanza Sul, Malanje, Moxico e Namibe – das manifestações, não resultou de atitudes ilegais dos manifestantes mas da dificuldade das instituições em respeitar o direito dos cidadãos a exprimir opiniões críticas;
  2. Cerca de 100 pessoas foram detidas, em 7 províncias, de que tenhamos actualmente conhecimento. Temos conhecimento directo de que várias foram detidas sem terem proferido quaisquer insultos, não terem arremessado coisa alguma e não terem agredido ninguém. Foram, inclusive, detidas pessoas que não estavam envolvidas nas manifestações em Luanda e Benguela, estando apenas em espaços contíguos;
  3. Há detenções feitas antes das manifestações, nomeadamente no Huambo e Lunda-Norte – mostrando a intenção de reprimir quem organiza ou participa em manifestações – e outras feitas no fim de um processo sem quaisquer incidentes. Houveram igualmente acções de repressão indiscriminada em bairros onde não estavam a decorrer manifestação alguma, com pelo menos uma agressão verbal e física a um cidadão que se encontrava na sua própria residência, por este questionar os métodos empregados pelas forças policiais. Há também inúmeros testemunhos de meios apreendidos e não devolvidos aos seus proprietários;
  4. Aguardamos pelas acusações, mas ficou por demais demonstrada a cultura de intimidação de quem queira exercer o seu direito de cidadão autónomo para criticar e usar a rua para se exprimir;
  5. Os desvios repetidos da lei por quem tem a função de a defender, não pode continuar a ficar impune, pelo que apelamos às testemunhas do que ocorreu – incluindo os agentes que são instrumentalizados para reprimir, ilegalmente, os seus concidadãos – a ajudarem-nos a reunir os factos, comunicar a verdade, e a agirmos legalmente contra abusos e crimes;
  6. A persistente acção da TPA, JA e RNA, de ocultar factos, ouvir apenas uma linha de opinião e, frequentemente, difundir mentiras sem qualquer preocupação pelo contraditório e pela verdade, tem de ser denunciada e corrigida;
  7. Apelamos a todos os cidadãos, independentemente do partido de que se sintam mais próximos ou do lugar onde trabalhem, a contribuírem para nos libertarmos deste ambiente de repressão e mentira, participando, divulgando e confrontando a ilegalidade e a instrumentalização das instituições;
  8. Apelamos para que se investigue, por mecanismos independentes, em que circunstâncias morreram pessoas, quem colocou pneus na via pública e quem usou, indevidamente de meios violentos, de forma indiscriminada, nas ruas por onde passaram os manifestantes e noutras que foram tratadas como zonas onde residem inimigos.

Contribuamos todos para não deixarmos este estado de coisas continuar e para melhorar o ambiente político e civil no nosso país. Apelamos particularmente aos detentores do poder político para que se recordem que, tal como a Independência foi o resultado da luta do povo, também a luta pela Liberdade e a Melhoria das Condições de Vida para Todos deve ser respeitada e acarinhada, para que tenhamos orgulho no país que somos.

Angola, 19 de junho de 2023

Subscrevem

Handeka
Mizangala Tu Yenu Kupolo
Associação Cívica Laulenu
Associação Yetu mu Yetu Angola
Movimento Hip Hop Terceira Divisão
Tchatokota
Jovens Unidos Por Causas Justas
Tchetu
Rede de Activistas de Benguela
Movimento Revolucionário de Benguela
Bloco de Resistência Leste
Brigada Cidadã do Ngola-Kiluanji – BCNK

Sara Ngueve Rafael Paulo
José Gomes Hata
Benedito Jeremias “Dito” Dalí
Luaty Beirão
Cristina Pinto
João Pinto
Gisela Caldeira da Silva
Tiago Ngana Chimbassi
Nelson Mucazo Euclides
Júlia Tembo Rodrigues
João dos Santos “Mwanangola”
Cesaltina Abreu
Alexandra Gamito
Albino Inocêncio Domingos Lopes
Carlos Figueiredo
Nelson Dibango Mendes dos Santos
Jaime Domingos “Jaime MC”
Florita Telo
Florence Kapita

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