CARTA ABERTA, “GOVERNO DE CABINDA IMPEDE A REALIZAÇÃO DA CONFERÊNCIA SOBRE A PAZ”


Ao

Exmo. Sr. Ministro da Justiça e dos Direitos Humanos

Dr. Francisco Manuel Monteiro de Queiroz

C//C:

Exmo. Sr. Ministro do Interior da República de Angola

Exmo. Sr. Governador da Província de Cabinda

Exmo. Sr. Presidente do Tribunal Constitucional

Exma. Srª. Provedora da Justiça de Angola

Exmo. Sr. Presidente da Comissão Africana e dos Povos

 Assunto: CARTA ABERTA, “GOVERNO DE CABINDA IMPEDE A REALIZAÇÃO DA CONFERÊNCIA SOBRE A PAZ”

Ex. Sr. Ministro da Justiça e dos Direitos Humanos. Francisco Manuel Monteiro de Queiroz

Melhores cumprimentos!

A associação OMUNGA e a Comissão Episcopal de Justiça e Paz da CEAST – Conferência Episcopal de Angola e São Tomé, manifestam veementemente a sua indignação diante da atitude pouco ortodoxa do Governo Provincial de Cabinda que culminou com o impedimento da realização de uma conferência que teria lugar no dia 21 de Maio de 2022, com início às 10 horas, numa das unidades hoteleiras em Cabinda, com o objectivo de reflectir sobre a paz e com enfoque no respeito pelos direitos humanos em Angola, particularmente na Província de Cabinda.

De salientar que a aludida conferência já tinha sido impedida de se realizar no passado dia 30 de Abril do corrente ano pelas autoridades de Cabinda, alegando a ausência do representante da OMUNGA na referida província, uma vez que a ADCDH – Associação para o Desenvolvimento da Cultura dos Direitos Humanos, o parceiro local, não está legalmente constituída para a realização da conferência. Apesar de todos os prejuízos causados, entendeu-se remarcar a conferência para o dia 21 de Maio de 2022 com a presença da Omunga no local da actividade e assumindo todas as questões organizativas.

Com todas as condições criadas, incluindo convites distribuídos às instituições públicas e privadas, fomos surpreendidos com um dispositivo policial no local, armado até aos dentes, com o objectivo de impedir a entrada de convidados, bem como dos organizadores da conferência. Segundo o chefe da missão policial, estava proibida a realização da actividade porque não tinha a autorização do Governo de Cabinda, uma vez que “para a realização de actividade do género, tal carece de uma autorização”, disse o agente da polícia nacional. Ainda na mesma linha, o Sr. Chala Gime, Director do Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa do Ministério do Interior em Cabinda, afirmou perante à agéncia LUSA que “a polícia compareceu no hotel porque a Omunga não cumpriu com os pressupostos administrativos a nível do governo de Cabinda, para vir fazer uma actividade deve dar a conhecer ao Governo. Além disso, aparece associada a ADCDH que não tem qualquer legitimidade, porque não é legal. As coisas ilegítimas não podem ser legitimadas e por isso a polícia apareceu no local para impedir a realização da actividade. A organização não cumpriu as formalidades legais”.

Os pronunciamentos do Director do Gabinete de Comunicação do Ministério do Interior em Cabinda são anti-constitucionais e estão eivados de atitudes xenófobas e com visão de exclusão, dando a entender como se Cabinda não fizesse parte do território de Angola.

A OMUNGA é uma organização de âmbito nacional, assim rezam os seus estatutos e os documentos que comprovam a sua legalização. É igualmente Membro Observador da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos desde o ano de 2007. Logo, a realização de conferências do gênero é o que a OMUNGA tem feito em todo território nacional e nunca precisou de autorização para a realização de quaisquer actividades. Porque entendemos nós que de acordo com a Constituição da República de Angola, mormente no seu artigo 1º “Angola é uma República soberana e independente, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade do povo angolano, que tem como objectivo fundamental a construção de uma sociedade livre, justa, democrática, solidária, de paz, igualdade e progresso social”.

A conquista da independência em 1975 e o fim da guerra civil no ano de 2002, devem servir de barômetros para medir a satisfação e o desejo de uma Angola libertada a todos os níveis. Hoje, passados 20 anos de paz, o povo soberano ainda é proibido de falar e reflectir sobre a paz no seu próprio território? Por outro lado, sabemos nós que Angola é um Estado unitário e todos devem obediência à Constituição da República e às leis ordinárias.

De acordo com o exposto acima, estamos diante de uma violação flagrante do direito de reunião e manifestação, conforme rezam os artigos 47º  e 48º CRA, bem como o dispositivo legal da Declaração dos Direitos Humanos, sobretudo nos seus artigos 19º e 20º, em consonância com o artigo 11º da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, todos eles ratificados pelo Estado angolano.

Exmo Sr. Ministro,

 Gostaríamos de concluir e recomendar ao Executivo angolano o seguinte:

Que se faça uma investigação independente com o intuito de se apurarem os elementos que estiveram na base do impedimento da realização da conferência;


Cabinda merece outro tratamento em matéria de direitos humanos. Não é possível uma província estratégica não ter uma única organização independente que vele pela situação dos direitos humanos;


É imperioso para Cabinda a viabilização e legalização de organizações da sociedade civil que trabalham na defesa e promoção dos direitos humanos. Entendemos nós que, num Estado democrático e de direito, como é o caso de Angola, não pode acontecer o que se assiste em Cabinda;

O Executivo angolano precisa dar espaço para a sociedade civil em Cabinda e não só, para acabar com a narrativa segundo a qual Cabinda não é Angola;

A OMUNGA e a Comissão Episcopal de Justiça e Paz da CEAST – Conferência Episcopal de Angola e São Tomé informam as autoridades e outras instituições afins, que a conferência será remarcada em breve, como forma de promover o exercicio da cidadania em Angola, particularmente na província de Cabinda;

Lobito, aos 26 de Maio de 2022

           Pela Omunga                                                                    Pela Comissão de Justiça e Paz

      João Malavindele                                                                             Pe. Celestino Epalanga

Director Executivo                                                                                    Director Geral

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